Livre_expressao

quinta-feira, novembro 09, 2006

Uma pausa para degustar Coffee and Cigarrettes

O cinema americano independente sempre exerceu sobre mim um certo fascínio, exatamente por fugir daquilo que Hollywood valoriza, apresentando linguagens e narrativas diferentes das que estamos habituados a acompanhar.

Coffee and cigarrettes é um desses filmes estranhos, que faz a platéia rir em alguns momentos, sentir-se entediada em outros e ainda assim sair do cinema com sentimentos opostos de ódio e amor pela obra. Sem meio termo. Caso não haja estes extremos, ao menos um estranhamento o espectador sente ao deixar a sala.

O longa metragem é uma série de 11 pequenas histórias, tendo a nicotina e a cafeína como o principal fio condutor. Com informalidade e irreverência, o projeto de Jim Jarmusch teve início em 1986, quando fez o curta metragem Strange to meet you, estrelando Roberto Benigni e Steven Wright com cigarros, café e um diálogo nonsense.

Todas estas histórias têm em comum a direção de arte e a fotografia, sintonizadas em preto (representando o café) e branco (representando o cigarro), hipocrisia social, cultura pop, muita fala em diálogos absurdos, pouca ação, e o minimalismo através de uma estranha celebração a vícios não muito saudáveis. Tudo acompanhado de uma trilha sonora refinada e de muito bom gosto, que inclui funk, jazz e rock'n'roll.

As situações criadas pelo cineasta polonês/americano, abordam o tudo e o nada. O café e o cigarro preenchendo constrangimentos nas relações humanas, e os assuntos variam desde idéias como sorvetes de café, Elvis Presley, a maneira correta de preparar um chá inglês, Paris nos anos 20, Abbott & Costello até a nicotina enquanto veneno para insetos. Conversas triviais, durante uma pausa para o consumo destas iguarias.

Discussões divertidas, outras nem tanto, porém, brilhantes atuações. Participações como a de Iggy Pop, Tom Waits, Renée French, Cate Blanchet, Meg e Jack White (membros da banda White Stripes), Bill Murray, os rappers RZA e GZA entre outros músicos/atores, que interpretam na maioria das vezes eles mesmos, em discussões rodeadas de xícaras de café e cinzeiros lotados. O ponto forte do filme é o encontro de Alfred Molina e Steve Coogan, no curta Cousins?, onde sentimos fortes pontadas de hipocrisia e desprezo disfarçado.

Apesar dos diferentes diretores de fotografia, a obra mantém uma estabilidade estética muito detalhista nas posições de câmera: planos gerais, planos médios e planos sobre a mesa.

Jim Jarmusch, atraído por momentos não necessariamente dramáticos da vida real, construiu durante 17 anos, um quebra cabeça que pode ser montado a gosto do espectador. Os filmes se relacionam a partir da falta de comunicação e pequenos ressentimentos, como repetições de um refrão. Embora exista um roteiro a ser seguido, o espaço para improvisos é evidente. Jarmusch nos possibilita um sentimento de voyeurismo ao observarmos cenas estranhamente cotidianas, com imensos contrastes entre o claro e o escuro, a razão e as necessidades, as neuroses e as reações.

Um longa metragem recortado em onze curtas que quase sacia nossas ausências, mas ainda nos deixa com aquela sensação prazerosa momentânea de um cigarro aceso e um café quente, e as duas fumacinhas se misturando diante de nosso nariz. Vale a pena degustar.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Infelizmente não ando com muito tempo para filmes, mas bem que gostaria. Para os independentes, principalmente. O melhor filme que já vi na vida foi "Buenos Aires 100km", não se se você já viu, Ariadne. É muito bom, como tudo o que os argentinos fazem.

9:22 AM  
Blogger lipão/fê said...

no sense e tempo vazio! pelo jeito caracteristica de jim jarmush

8:02 AM  

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