Livre_expressao

segunda-feira, dezembro 04, 2006

Bete

A primeira vez que ele a viu foi na praia. Ela usava a parte de cima do biquíni verde, um shortinho vermelho, uma sandália branca de plástico em formato de sapato de boneca, a pele bronzeada, o cabelo tingido de ruivo e grandes olhos pretos. Incríveis as cores daquela moça, ele pensou.
Ela caminhava rebolando, sem dar bola nenhuma para ele.
Ele, sentado em uma cadeira de praia alugada, uma lata de cerveja na mão, óculos escuros, barriguinha típica da meia idade.
Ela passou, deslumbrante. Nem deu bola.

A segunda vez foi na farmácia. Ela de óculos escuros, cabelos presos num coque, vestido bege longo e as mesmas sandálias brancas de plástico. Ele comprava aspirina e ela, um bronzeador.
Aproximaram-se do caixa, ele cedeu a vez com um olhar de galã. Ela agradeceu com um gesto de cabeça e passou na frente dele. Ele passeou com os olhos pelas costas desnudas da moça. Belas costas, bem desenhadas. Continuou a passear os olhos, focando agora seu belo e largo quadril. Ela parecia sentir o passeio, e como se para provocar, ajeitou delicadamente a calcinha. Deu pouco menos que um passo a frente, e pôde sentir o perfume de hidratante de pitanga, que ele não conseguiu identificar logo de cara. Ela pagou e saiu. Rapidamente desapareceu na avenida.

Na terceira vez ela estava num bar, sentada sozinha, tomava um troço colorido, daqueles que vem com um guarda-chuvinha e uma cereja espetada num palitinho.
Ele pensou em se aproximar. Sentou em uma mesa ao lado, pediu um chopp. Que velho idiota eu sou, pensava ele. Aquela mulher-monumento ao lado, e ele com medo de dizer oi, de oferecer uma bebida, perguntar o nome ou qualquer outra maneira de se começar uma conversa.
Só que dessa vez ela olhou para ele. Ela estava maquiada e linda. Mais linda e provocante do que nunca.

- Gosta de sex on the beach? – Disse ela, com forte batom vermelho nos lábios.
- Como? – esforçou-se para não gaguejar.
- O drink, sex on the beach?
- Ah… então, eu gosto de cerveja.

Ele já estava suando, se sentindo o homem mais frouxo do mundo. Com medo daquela deusa-ruiva-tingida de forte batom vermelho. Mas respirou fundo e disse com voz firme:

- Posso me sentar com você?
- Pode.
- Meu nome é Jaques.
- O meu é Bete.

Bete! Deve ser Elisabete, que mulher! Que nome!

- Se importa se eu for rapidamente ao toilet?
- Imagina, Bete, fique a vontade. Eu peço uma bebida para você enquanto isso.
- Sex on the beach – disse enquanto se levantava.

Ele passeou os olhos novamente no corpo da moça. Quantas curvas, quantas cores. O sapato não era mais de plástico. Tinha salto, mas não muito alto. A calça jeans justa e o top azul royal com decote convidativo.
Ela saiu da mesa e se dirigiu ao banheiro. Cumprimentou os garçons com um sorriso durante o percurso. Ele ficou lá, aguardando, feliz. Satisfeito com o flerte.
Imaginou Bete em sua cama, lasciva, latejante, sussurrante. Ficou de pau duro, e mudou a posição na cadeira para tentar disfarçar.

Agora no quarto, nua em sua cama, Bete ajeitava o cabelo olhando para um pequeno espelho de bolsa. Jaques deitado, cansado e realizado pensou em casar com aquela moça. Queria foder com ela até o último de seus dias. Ele sorriu pensando algo romântico para dizer quando ela o interrompeu.

- São 200 pratas.
- Como?
- Tenho que ir embora, se pudermos agilizar...
- 200...?

Ela levantou, ele passeou pela última vez os olhos naquele corpo escultural. Sentiu vontade de bater nela. Uma surra. Agarra-la pelos cabelos e joga-la no chão. Chuta-la, bater na cara. Aquela cara de vadia que só ele não tinha percebido. Bater nela por todos os paus que ela já tinha chupado na vida. Por todos os velhos patéticos, como ele, que ela enganou com ar de “moça difícil”. Vagabunda.
Mas ao invés disso se levantou, foi até a carteira e fez um cheque. Claro que ele não tinha 200 pratas na carteira.
Ela, já vestida, pegou o cheque com cara de quem não gosta de receber em cheque. Deu-lhe um beijo na testa e sorriu.

- Tchau Seu Jaques, pode me ligar quando quiser de novo. – E sorriu um sorriso perverso.

Seu Jaques é o caralho, ele pensou. Mas não falou nada. Ainda levou a moça até a porta.

- Bete porra nenhuma... deve ter um nome em cada canto da cidade. - Falou em voz alta depois de fechar a porta. Foi até a geladeira, pegou uma cerveja e sentou na poltrona. Patético. Inconsolável.

A moça foi embora, rapidamente desapareceu na avenida. Tirou da bolsa um chiclete e os óculos escuros. Percebeu que um homem a olhava. Passou rebolando e não deu a mínima bola.


Ariadne Catanzaro

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

pq tu não manda um conto teu para o site do projeto Releituras, para eles analisarem e publicarem? tu tem o talento q eu nunca vou ter ;-)

4:51 PM  

Postar um comentário

<< Home