Livre_expressao

sexta-feira, dezembro 21, 2007

Quem?


Sou esta mas sou outra.
Sou etérea
impermeável
atemporal.
Sou Intrínseca
Molhada
Descabelada
Controlada.
Sou comedida
Escandalosa.
Sou sua mas também sou sozinha.
Sou desconfiada,
Encabulada
Divertida e depressiva.
Sou vedete
Sou chacrete
Sou intérprete nas horas vagas.
Sou santa
Sou mãe
Sou art nouveau
retrô
decadente.
Sou curiosa
Maliciosa
Exotérica
E maldita.
Sou uma só
Sem tempo para ser outras.
Sou outras quando me falta o fôlego.
Sou ela quando não quero ser eu.
Sou eu quando não posso ser mais nada.


Ariadne Catanzaro

sexta-feira, dezembro 07, 2007

Diferentes

Sofia chegou em casa muito cansada.
Encontrou Rodolfo estirado no sofá.
Ao entrar na sala deu-lhe um sorriso, jogou um beijo de longe e correu para o banheiro.
Voltou aliviada, deu-lhe um beijo na boca e outro na testa.
Rodolfo perguntou se ela estava com fome. Negou com movimento de cabeça.
- Sede?
- Também não.
- Frio?
Sofia riu.
- Não, estou cansada, precisando de um banho.
Antes de se dirigir à chuveirada, Sofia contou a Rodolfo seu longo dia. O que fez, o que deixou de fazer, com quem encontrou, sobre o que conversou, seus momentos de tédio e descreveu quão cheio estava o ônibus e as pessoas mais esquisitas que ali estavam.
Rodolfo escutou pacientemente, sorrindo na maioria do tempo.
- E seu dia, tudo bem?
Rodolfo fez que sim com a cabeça. Em meia dúzia de palavras descreveu o que tinha feito. Disse que tinha chegado há menos de uma hora e a estava esperando para comer.
- Então vou tomar banho e comemos qualquer coisa.
Naquele dia Sofia parou para pensar como eram diferentes.
Não era possível que só aquilo tinha acontecido no dia de Rodolfo. Ficou pensando porque ele era tão quieto e reservado.
Ficou triste em imaginar que ele poderia esconder alguma coisa. Pequena que fosse. Alguém com quem ele conversou, um momento de mau humor, uma moça que olhou para ele na rua. Ou algo maior. Um emprego novo que ele estava arrumando, um problema no banco, uma briga com a irmã. Estava desconfiada de suas poucas palavras, mas mais do que isso, estava triste em imaginar que ele escondesse algo, qualquer algo que fosse. Pensou que homens e mulheres são mesmo diferentes. Devem ser, mas não queria que fossem. Queria ter dele todas as informações que ele tinha dela. Queria detalhes do que acontecia com ele. Queria entender os problemas que ele tinha, as alegrias, os desejos, tudo.
Se achou boba por contar tantas coisas, já que não recebia metade das mesmas informações sobre como foi o dia.
Preocupou-se de que podia estar paranóica. Tomou banho tensa.
Saindo do banheiro, ainda enrolada na toalha, correu para a escrivaninha e pegou uma revista feminina cheia de artigos escritos por psicólogos. Aquelas que tratam homens e mulheres como fórmulas, que têm explicação para tudo. Que separam bem as diferenças entre homens e mulheres. Lembrou que já tinha lido algo a respeito de homens serem tão calados e mulheres tão falantes.
Encontrou o artigo: 47 estratégias para melhorar seu relacionamento. Segundo um psicólogo americano de uma universidade de sucesso, os homens falam pouco mesmo porque querem evitar conflito. Porque preferem não dar muita satisfação para que as mulheres não os encham de perguntas.
A resposta da revista não foi suficiente.
Continuou chateada só em pensar que não era possível que ele SÓ tivesse feito aquilo. Queria detalhe por detalhe da vida dele.
Achou que podia estar exagerando, se trocou e foi comer alguma coisa junto a ele.
Rodolfo, monossilábico, prestava atenção em cada palavra que Sofia dizia.
Foram dormir depois de um filme mais-ou-menos na TV.
Encostou a cabeça no travesseiro e não conseguiu pregar o olho.
Quando Rodolfo começou a respirar mais profundamente, engatando em seu primeiro sono, Sofia perguntou:
- Foi só isso mesmo?
- Hum?
- Você não fez mais nada hoje?
- Como assim?
- Você não tem mais nada para me contar?
Rodolfo abriu os olhos, virou-se para Sofia, sem entender nada respodeu:
- Não, por que?
- Por nada. Boa noite.
Deram um beijo e se ajeitaram.
Rodolfo ficou a pensar que diabos Sofia estava pensando.
Sofia ficou a pensar que diabos Rodolfo estava escondendo.